sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Lei ‘fecha o cerco’ para prefeitos e candidatos que não tratarem de lixo


A partir de agosto de 2014, serão proibidos os lixões a céu aberto no Brasil (Foto: Marcello Casal/Abr)
Com a proximidade das eleições municipais, discussões sobre coleta seletiva, destino do lixo, reciclagem e consumo consciente figuram entre os temas centrais dos debates entre candidatos, mas, muitas vezes, nada sai do papel. O que pouco se sabe, porém, é que até 2014 promessas não deverão ser apenas isso: daqui a dois anos todos os lixões a céu aberto deverão ser transformados em aterro sanitário. O depósito de resíduos sólidos nesses locais deve ficar restrito a objetos e rejeitos que não tenham mais utilidade.
Com isso, será penalizado o administrador público que deposite em aterros os rejeitos que ainda possam ser reutilizados – seja para compostagem, no caso de lixo orgânico, seja de reciclagem, no caso de materiais de composição reutilizável. Prefeitos e candidatos, portanto, terão o “cerco fechado” com a obrigatoriedade do destino correto. E quanto aos cidadãos e às empresas, corresponsáveis pela questão, restam a prática e a consciência de consumo.
“Um dos dramas do Brasil é que quase todos os aterros sanitários acabaram como lixões. Quase todos por descontinuidade, por desconhecimento ou mesmo por contradições. A maior parte desses locais que poderia ser utilizado de maneira correta do destino do lixo, não fazem”, afirma o secretário de Recursos Hídricos e Ambiente Urbano do Ministério do Meio Ambiente (MMA), Pedro Wilson Guimarães.
A Lei 12.305, conhecida como Plano Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), sancionada em 2010, traça objetivos e números para que todos os municípios se adaptem a uma outra gestão de resíduos, diferente desta que se aplica atualmente. De um lado está o poder público, oferecendo serviços suficientes de coleta e destino corretos dos resíduos, além de aplicar e trabalhar o tema da consciência ambiental e de consumo. E, de outro, os cidadãos, participantes e favorecidos de toda a mudança de política ambiental, de saúde e de tantos outros temas que se relacionam com a questão.
2 de agosto foi o último dia para que estados e municípios interessados em investimentos do governo federal na área de resíduos sólidos entregassem ao Ministério do Meio Ambiente um plano de gestão para resíduos sólidos. Havia a possibilidade também de que as prefeituras que fazem parte de consórcios intermunicipais pudessem, em conjunto, elaborar um plano de gestão de resíduos sólidos. Segundo o ministério, 488 municípios receberam recursos federais para a elaboração de seus planos.
Segundo o secretário Pedro Wilson, um dos melhores caminhos para o cumprimento da lei que entrará em vigor em 2014 é que os municípios se integrem para a utilização dos aterros sanitários. “Cada município pode procurar outro próximo e fazer uma parceria regional. A solução agora é não estar sozinho”, disse.
“Somando os municípios que acessaram recursos da União e outras iniciativas independentes que nos foram informadas, a estimativa é de que cerca de 50% da população brasileira reside em municípios que estão elaborando ou executando seus planos”, destacou a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira.
Estanislau Maria, coordenador do Instituto Akatu para o Consumo Consciente, aposta no sucesso da aplicação da nova lei. Para ele, o Plano Nacional de Resíduos Sólidos é “ideal e sofisticado, mas, para isso, não pode ter um tempo de adaptação infinito”. “A aplicação dessas condições propostas pela lei significa gasto público. Mas se o prefeito apresentar um bom plano, ele dividirá as responsabilidades, e isso significa que vai gastar menos com lixo”, acredita Maria.
“Essa lei é o início do fechamento do cerco para candidatos e prefeitos que não colaboram com a questão. Agora já não é mais de decisão deles. É lei”, acrescenta. Em 2010, o país gerou 60,8 milhões de toneladas de resíduos sólidos – 6,8% a mais que em 2009. Sendo que mais de 40% dessa quantidade vão parar em lixões ou aterros controlados, de acordo com o Centro Multidisciplinar de Estudos em Resíduos Sólidos (CeRSOL) da Universidade de São Paulo (USP).

A consciência e o consumo

O coordenador do Instituto Akatu faz um apelo a todos os envolvidos na cadeia dos resíduos sólidos ao afirmar que o consumo consciente ainda é um dos fatores principais do problema no Brasil. “O consumo e a geração de resíduos estão interligados. A gente precisa de uma educação formal em qualquer nível de governo. Para o consumidor, para as empresas e para os governos reduzirem resíduos, a primeira coisa que deve ser feita é o planejamento do consumo. O consumo, na verdade, é um encadeamento de etapas, é um processo que começa do planejamento de compras e passa pelo desperdício”, pontua.
Nina Orlow, integrante do grupo de trabalho sobre meio ambiente da Rede Nossa São Paulo, acredita que a questão dos resíduos sólidos deve ser indissociável ao consumo. “Não queremos simplesmente tratar do lixo para que ele vá direto para um lugar mais adequado, mas fazer campanhas desde a produção, o consumo, o descarte correto e as possibilidades que esse material oferece”, disse.
Para Nina, um planejamento integrado facilitará a minimização dos gastos de cada município, contudo, deve estar atrelado à realidade local. “Não adianta soluções importadas e pontuais, quando a nossa realidade requer outra abordagem. Para isso, é preciso desenvolver um trabalho que identifique os desafios locais e, ao mesmo tempo, a viabilidade econômica”, afirmou.

A polêmica da incineração

Quando se trata de destino correto para os resíduos sólidos, a discussão sobre processos incineratórios inevitavelmente vira polêmica. Os movimentos de cooperativas de catadores de material reciclável são contrários à incineração, que é a queima do lixo para obtenção de gás ou adubo, argumentando que as queimadas retiram materiais que poderiam ser recolhidos pelos catadores e reaproveitados nos processos de reciclagem. Para Nina Orlow, a incineração deve ser “a última das alternativas, depois de esgotadas todas as outras”, considera. Nina acredita que com a incineração as pessoas terão a falsa de ideia de que não precisarão mais reduzir o consumo.
Pedro Wilson, do MMA, no entanto, é um dos defensores da produção de energia a partir do gás obtido na incineração. “Na Europa eles estão dando preferência para gerar energia, por conta da crise. Mas no Brasil podemos também trabalhar para geração de energia com incineração dos resídios sólidos ou trabalhando a ideia de produção de gas com a biomassa obtida”, conclui.
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