Idealizador da Escola da Ponte prega revolução no aprendizado e critica formação de professor no Brasil
Fonte: O Globo (RJ)
O Educador
português José Pacheco, ex-diretor da Escola da Ponte, onde não há
provas nem divisão por séries: "É preciso uma ruptura, em busca de uma
nova Escola"
Inovação. Alunos do Projeto Âncora,
em Cotia (SP): não há turmas definidas, e o conteúdo é assimilado e
compartilhado pelos estudantes entre si, no ambiente Escolar
Não existe
um modelo padrão de Ensino. Cada Escola deve se organizar para atender a
seus Alunos. Quem defende a ideia é o Educador José Pacheco que, por
mais de 30 anos, dirigiu a inovadora Escola da Ponte, em Portugal, onde o
aprendizado é pautado pela confiança entre estudante e Professor: não
há salas de aula tradicionais, grade curricular ou provas. Os bons
resultados da instituição dão a Pacheco autoridade para questionar o
método de Ensino atual. Na era das redes sociais, ele defende o
compartilhamento do conteúdo Escolar pelos Alunos, levando a uma
construção coletiva do saber. O Educador também classifica como
"miserável" a formação dos Professores no Brasil.
- Nada
acontece de diferente quando a teoria antecede a prática. É preciso uma
ruptura com os modelos convencionais, em busca de uma nova Escola, que
se organize em torno dos valores que unem as pessoas atendidas. A Escola
não é um edifício, mas um espaço social - comenta o português, que
participará do Conecta, evento sobre novas tecnologias e Educação, que
ocorre quarta e quinta-feira, no Rio.
Pacheco é um dos idealizadores da
Escola da Ponte, na pequena Vila das Aves, a 30 quilômetros do Porto. Na
instituição, os Alunos se agrupam de acordo com sua área de interesse.
Não há divisão por séries. Monitorados por Professores, o estudante faz
seu plano de metas baseado no conteúdo sugerido pelo Ministério da
Educação. A metodologia ganhou fama global. Encantado, o escritor e
Educador Rubem Alves escreveu trabalhos como "A Escola com que sempre
sonhei sem imaginar que pudesse existir" (2003). Cerca de cem
instituições no Brasil mudaram para, de certa forma, seguir o exemplo.
O próprio
Pacheco está envolvido numa iniciativa que segue essas premissas, em
Cotia (SP). Com 440 Alunos, cujas famílias têm rendas de até três
salários mínimos, o Projeto Âncora serve ao Pré-Escolar e ao Ensino
fundamental, sem turmas definidas. O aprendizado se dá conforme o
interesse dos Alunos, que assimilam o conteúdo e o compartilham no
ambiente Escolar.
- É um
trabalho de formiguinha. Na implantação do projeto, rejeitamos tudo que
não interessa. Aulas e séries são um obstáculo para o crescimento humano
- diz ele.
Os
resultados, segundo Pacheco, são animadores. Alunos marcados pela
exclusão recebem atenção que nunca tiveram. Em seis meses, crianças
analfabetas aprenderam a ler, e os Professores embarcaram na novidade.
Mas o Educador se mostra preocupado
com o quadro geral do Ensino no Brasil e no mundo. Na opinião dele, os
métodos em voga estão obsoletos desde o fim do século XIX.
- Basta dizer que, no Brasil, esse
tipo de Educação dá origem a 24 milhões de Analfabetos funcionais. Não
adianta ser a sexta economia do mundo, quando se ocupa os últimos
lugares em rankings de Educação - critica Pacheco, para quem o
despreparo das Escolas fica latente diante de questões atuais como o
bullying. - Muitas Escolas suspendem ou expulsam Alunos, instalam
câmeras de segurança. Deveriam ser adotadas novas formas de diálogo.
Para resolver esse problema, diz ele, é essencial investir na formação de Educadores:
- A
formação de Professores no Brasil, não hesito em dizer, é miserável.
Parte de princípios errados, como aquele de que a teoria pode anteceder a
prática. Não adianta colocar jovens na faculdade e enchê-los com
teorias ultrapassadas. Eles perpetuarão esse modelo.
Pacheco diz
que a renovação deve englobar a forma como as recentes tecnologias são
aplicadas no Ensino. Em tempo de redes sociais, não basta apenas
introduzir computadores e mudar o velho quadro-negro pelo monitor
digital.
- Mesmo nos
EUA e na Europa, o modelo convencional de Educação continua. As novas
tecnologias contribuem para a mesmice, quando deveriam proporcionar o
compartilhamento de conteúdo entre os Alunos. Se as Escolas entenderem
isso, podem migrar de um modelo em que os estudantes são como papagaios
repetindo a lição para um ambiente onde ocorra, de fato, a construção do
saber - diz o Educador. - Os jovens precisam ser incentivados a
reconstruir uma sociedade doente e usar as tecnologias para fazer isso
criticamente. Noto que essas ferramentas contribuem para que os Alunos
se tornem solitários. Isso é uma regressão.
Evento debaterá uso de tecnologias de forma crítica
Quando o assunto é tecnologia na
Educação brasileira, os desafios são inúmeros. Boa parte deles estará em
pauta quarta e quinta-feira, na segunda edição do Conecta, realizado
pela Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), no
Centro de Convenções SulAmérica. Haverá palestras, oficinas e uma
exposição com o que há de mais moderno em equipamentos para o Ensino.
- Queremos
mobilizar os Educadores para o uso desses meios de forma crítica. A
sociedade está mudando, e a tecnologia está diretamente envolvida nisso,
influenciando o comportamento das pessoas e vice-versa. A Escola não
pode ficar de fora, para não ser atropelada - explica o assessor de
tecnologias educacionais do Sistema Firjan, Bruno Souza Gomes.
Segundo
ele, um dos maiores imbróglios é a baixa qualidade da conexão de
internet. A discussão terá destaque na programação, com a divulgação do
relatório "Horizon Report", resultado de três meses de pesquisas feitas
por 30 especialistas em tecnologia e Educação do Brasil.
O
documento, diz Gomes, mostra, entre outros tópicos, como o serviço
disponível no país está distante do praticado no restante do mundo.
Segundo ele, de nada adianta o investimento em equipamentos de última
geração se o Aluno não consegue acessar o conteúdo digital.
- Essa discussão tem que ser uma pauta efetiva do governo - avalia ele.
A pesquisa,
de acordo com o especialista, também aponta a urgência de uma
readequação do currículo Escolar em função dos novos meios. Ou seja, o
Ensino contemporâneo precisa ser pensado também em função das
possibilidades oferecidas. Parte dessa constatação se justifica pela
demanda de mobilidade apresentada pelas novas gerações de Alunos.
- Os jovens
querem aprender em qualquer lugar e momento. A tecnologia quebra a
barreira da sala como único local de Ensino. Isso envolve todas as
classes sociais.
Para uma
visualização precisa da utilização desses instrumentos, o evento promove
também a Expo Conecta: seis espaços vão mostrar instrumentos de alta
tecnologia que podem ser introduzidos em Escolas de Ensino fundamental e
profissionalizante. Entre os aparelhos que merecem destaque, está a
caverna digital, espécie de cubo formado por telas que projetam
ambientes, como uma plataforma de petróleo, a turbina de um avião e até o
sistema solar.
O Conecta
começa às 10h de quarta. Entre os palestrantes, há representantes de
universidades, Escolas e organizações sem fins lucrativos, além de
jornalistas. A palestra do Educador português José Pacheco, idealizador
da Escola da Ponte, acontece às 9h de quinta-feira.
Blog rafaelrag com o professor Damásio
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