A
expansão das instituições obrigou uma mudança profunda nos pilares do
ensino superior e a popularização quebra o paradigma da dedicação
minuciosa de mestres eruditos a seus poucos discípulos. Universidades são instituições que atravessaram os séculos inclusive
no Paraná, cuja Federal chega ao centenário neste ano. E há séculos elas
se deparam com as mesmas contradições: ensinar a pensar ou treinar,
pragmaticamente, futuros profissionais? Preparar para a vida ou para o
mercado?
A resposta, evidentemente, não é uma só: no mundo todo, universidades sempre cumpriram, com razoável sucesso, múltiplas funções. Mas sua expansão, no século 20, colocou uma nova e definitiva pergunta: formar uma elite, conforme mandava a tradição, ou abrir as portas para a multidão de jovens em idade universitária? O segundo caminho, hoje sem volta (e em muitos aspectos é bom que seja assim), implicou uma mudança profunda naquilo que, desde a invenção da universidade moderna, em Bolonha (Itália), provavelmente em 1088, deveria ser um dos pilares do ensino superior: a dedicação minuciosa de mestres eruditos a seus poucos discípulos.
Nos primórdios da universidade ou, antes, da pedagogia a relação professor-aluno, fundamentalmente de afeto e cumplicidade, mas de rivalidade intelectual também, era central: basta pensar nos filósofos gregos e seus pupilos; e ainda hoje, em Oxford e Cambridge, por exemplo, isso sobrevive em parte nos chamados tutoriais, que lá são a base dos cursos de graduação em qualquer área. Não há quase aulas, e sim, como se costuma indistintamente nomear nas instituições brasileiras, orientações (aqui, geralmente um privilégio de pós-graduandos).
Essa relação pedagógica, digamos, íntima servia e serve a um ideal de universidade que, também há muito tempo, frequentemente se choca com o que as sociedades que abrigam universidades pagando, com impostos, o funcionamento de algumas delas esperam que seja o papel dessas instituições.
Conforme lembra, num livro sobre o tema (What Are Universities For? [Para que servem as universidades?, em tradução livre], Penguin Books), um dos entrevistados deste caderno, o historiador inglês Stefan Collini, corria ainda o século 12 quando, em Oxford, surgiu a primeira rusga em torno de certas inutilidades ensinadas na histórica universidade local na época, universitários eram jovens em treinamento para servir à igreja ou à realeza. Havia então, como hoje, certa rejeição a que perdessem tempo ruminando reflexões sobre o sentido da vida ou de obras literárias e filosóficas, da arte em geral.
Mas, pergunta o psicanalista Leonardo Ferrari, também em entrevista a este G Ideias: Quem julga o que é útil e o que não é? Uma comissão de sábios? Henry Ford declarou que, se fosse obedecer ao que o mercado estava pedindo na época, o útil, ele teria fabricado cavalos mais velozes, cavalos mais resistentes, cavalos mais lustrosos. Cavalos, não automóveis, ilustra Ferrari. Sem aquelas inutilidades, a ideia de automóvel não vem. Pode haver cursos, mas não universidade.
Nas entrevistas a seguir nas próximas páginas, esses dois especialistas discutem a ideia de universidade no século 21. E, professores que são, não deixam de enfatizar o aspecto fundamental da relação com alunos cada vez mais confiantes num certo autodidatismo (via web), e ainda assim em busca de uma formação universitária. Mas que formação? Afinal, o que esperar, hoje, de uma universidade?
A resposta, evidentemente, não é uma só: no mundo todo, universidades sempre cumpriram, com razoável sucesso, múltiplas funções. Mas sua expansão, no século 20, colocou uma nova e definitiva pergunta: formar uma elite, conforme mandava a tradição, ou abrir as portas para a multidão de jovens em idade universitária? O segundo caminho, hoje sem volta (e em muitos aspectos é bom que seja assim), implicou uma mudança profunda naquilo que, desde a invenção da universidade moderna, em Bolonha (Itália), provavelmente em 1088, deveria ser um dos pilares do ensino superior: a dedicação minuciosa de mestres eruditos a seus poucos discípulos.
Nos primórdios da universidade ou, antes, da pedagogia a relação professor-aluno, fundamentalmente de afeto e cumplicidade, mas de rivalidade intelectual também, era central: basta pensar nos filósofos gregos e seus pupilos; e ainda hoje, em Oxford e Cambridge, por exemplo, isso sobrevive em parte nos chamados tutoriais, que lá são a base dos cursos de graduação em qualquer área. Não há quase aulas, e sim, como se costuma indistintamente nomear nas instituições brasileiras, orientações (aqui, geralmente um privilégio de pós-graduandos).
Essa relação pedagógica, digamos, íntima servia e serve a um ideal de universidade que, também há muito tempo, frequentemente se choca com o que as sociedades que abrigam universidades pagando, com impostos, o funcionamento de algumas delas esperam que seja o papel dessas instituições.
Conforme lembra, num livro sobre o tema (What Are Universities For? [Para que servem as universidades?, em tradução livre], Penguin Books), um dos entrevistados deste caderno, o historiador inglês Stefan Collini, corria ainda o século 12 quando, em Oxford, surgiu a primeira rusga em torno de certas inutilidades ensinadas na histórica universidade local na época, universitários eram jovens em treinamento para servir à igreja ou à realeza. Havia então, como hoje, certa rejeição a que perdessem tempo ruminando reflexões sobre o sentido da vida ou de obras literárias e filosóficas, da arte em geral.
Mas, pergunta o psicanalista Leonardo Ferrari, também em entrevista a este G Ideias: Quem julga o que é útil e o que não é? Uma comissão de sábios? Henry Ford declarou que, se fosse obedecer ao que o mercado estava pedindo na época, o útil, ele teria fabricado cavalos mais velozes, cavalos mais resistentes, cavalos mais lustrosos. Cavalos, não automóveis, ilustra Ferrari. Sem aquelas inutilidades, a ideia de automóvel não vem. Pode haver cursos, mas não universidade.
Nas entrevistas a seguir nas próximas páginas, esses dois especialistas discutem a ideia de universidade no século 21. E, professores que são, não deixam de enfatizar o aspecto fundamental da relação com alunos cada vez mais confiantes num certo autodidatismo (via web), e ainda assim em busca de uma formação universitária. Mas que formação? Afinal, o que esperar, hoje, de uma universidade?
Fonte: Gazeta do Povo de 17.11.2012
Blog rafaelrag
Nenhum comentário:
Postar um comentário