Portugal
é o principal destino dos estudantes brasileiros de graduação bolsistas
do Programa Ciência sem Fronteiras. Do total de 12.193 alunos incluídos
no programa, praticamente um em cada cinco optou por cursar parte do
ensino superior em uma instituição lusitana.
Há
em Portugal 2.343 alunos do Brasil - 20 a mais do que o número de
bolsistas de graduação nos Estados Unidos, principal destino no programa
se forem considerados também os pesquisadores (pós-graduandos). Os
dados, referentes a setembro, são do Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).
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Os
783 bolsistas da Capes estão matriculados em mais de uma dezena de
cursos (desde a área de saúde à tecnologia espacial) de 41 universidades
e institutos portugueses. O CNPq não informou a distribuição detalhada
dos seus bolsistas. Além dos graduandos, Portugal recebe 329 doutorandos
(84 fazendo curso integral no país, com duração de cerca de quatro
anos) e mais 103 pós-doutorandos, por meio do programa.
O
total de estudantes e pesquisadores brasileiros das áreas de tecnologia
e biomédica em Portugal (2.775) é inferior apenas ao dos Estados Unidos
(3.898). O número já supera o de destinos tradicionais de pesquisadores
brasileiros como a França (2.478), Espanha (2.261), o Canadá (1.408), a
Alemanha (1.111) e o Japão (680).
Entre
os motivos para a escolha de Portugal está a inexistência de barreira
linguística, uma vez que o país não exige exame de proficiência dos
brasileiros, diferentemente dos Estados Unidos, por exemplo, que cobram
de estudantes estrangeiros o Test Of English as a Foreign Language,
Toefl. Outro fator que atrai estudantes brasileiros é a possibilidade de
integração à produção científica na Comunidade Europeia. Além disso,
Portugal, apesar da crise, mantém subvenções como a oferta de albergues
para estudantes da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP) e
tem custo de vida mais baixo que outros destinos da Europa com atividade
econômica mais forte, como a Alemanha, Inglaterra e França.
Estudante
de Química Industrial na Universidade Estadual da Paraíba (UEPB) Aline
Pacheco Albuquerque diz que a escolha de Portugal foi motivada pelo fato
de o país não exigir fluência em nenhum outro idioma. "É uma
universidade boa que não ia exigir domínio de outra língua no processo
de seleção", diz a estudante se referindo à Faculdade de Ciências da
Universidade de Lisboa, onde é bolsista.
Para
o vice-reitor da Universidade de Coimbra, Joaquim Ramos de Carvalho, o
estudante do Ciência sem Fronteiras tem a oportunidade de ter contato
com a produção científica europeia. "Estamos muito empenhados para que
os estudantes do Ciência sem Fronteiras não se limitem à presença em
sala de aula, queremos que tenham interação com toda parte de inovação e
transferência de saber e também com a nossa rede europeia de contatos e
de projetos."
A
presença de tantos acadêmicos brasileiros em Portugal muda o patamar de
cooperação dos dois países, avalia o Itamaraty. Juntamente com o Ano do
Brasil em Portugal, o Programa Ciência sem Fronteiras tem sido citado
pela diplomacia brasileira como um dos principais alavancadores da
aproximação entre os dois países. "Não é só a celebração [cultural] que
nos aproxima, mas também a modernidade dos dois países", comentou o
chanceler brasileiro Antonio Patriota ao receber em setembro, em
Brasília, o ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal, Paulo
Portas.
Para
o embaixador do Brasil em Portugal, Mario Vilalva, os dois países vivem
"um momento mágico das relações bilaterais" e "há uma enorme
convergência de interesses", como na área de cooperação científica.
Segundo
o edital da Capes e do CNPq, o Programa Ciência sem Fronteiras visa a
"propiciar a formação de recursos humanos altamente qualificados nas
melhores universidades e instituições de pesquisa estrangeiras". O
objetivo é promover a internacionalização da ciência e tecnologia
nacional, estimulando estudos e pesquisas de brasileiros no exterior,
com a expansão do intercâmbio de graduandos e graduados.
Cortes orçamentários
A
austeridade imposta às despesas públicas pelo governo português e os
cortes de financiamento das universidades lusitanas, previstos no
Orçamento de Estado 2013, em tramitação na Assembleia da República
(equivalente ao Congresso Nacional), não afetarão a capacidade de
recepção dos estudantes brasileiros nas universidades portuguesas que
acolhem bolsistas do Programa Ciência sem Fonteira.
"As
restrições orçamentárias que temos não afetam a qualidade das nossas
universidades", garantiu o ministro da Educação e da Ciência de
Portugal, Nuno Crato. Para o próximo ano, está previsto um enxugamento
de 3,2% no orçamento das universidades e dos institutos superiores.
Segundo Crato, essa contenção de despesas será apenas por "um certo
período".
"Temos
todos a preocupação de não diminuir a qualidade das nossas
universidades e centros de investigação, que têm registrado um progresso
contínuo e continuarão a registrá-lo", disse o ministro. "O governo tem
presente que o trabalho das universidades é importante para o país e
que é preciso incentivar o crescimento das instituições que têm provas
dadas de excelência, apesar do difícil contexto em que vivemos",
completou.
Portugal
foi o país europeu que registrou o maior crescimento no número de
formandos de matemática, ciências e tecnologia na última década. Segundo
dados da Rede Eurydice, agência de educação, cultura e audiovisual da
Comissão Europeia, a porcentagem dos formandos nessas áreas passou de
17% do total de licenciados, em 2001, para 21% em 2010.
"Nos
últimos anos, Portugal desenvolveu-se extraordinariamente no aspecto
científico. Temos centros e universidades que são competitivos com o que
de melhor se faz na Europa e no mundo", destaca Nuno Crato.
Segundo
o ministro, prova da excelência do país na área científica está na
seleção, este ano, de nove pesquisadores portugueses para as bolsas do
Conselho Europeu de Investigação (ERC) em áreas como engenharia
informática, química e ciências biomédicas. "São bolsas altamente
competitivas e recebê-las mostra a grande qualidade do sistema
científico nacional."
Além
da projeção de Portugal no cenário europeu, Crato defende a parceria
com o Brasil. "Isso [a cooperação com o Brasil] ajudará a dinamizar os
nossos programas e a torná-los ainda mais internacionais. Ajudará
também, creio, a desenvolver no Brasil a nova geração de cientistas,
técnicos e diplomados de que este grande país necessita para o seu
desenvolvimento."
A
aproximação científica entre Brasil e Portugal não ocorre apenas por
meio do Ciência sem Fronteiras. No mês passado, o Conselho Coordenador
dos Institutos Superiores Politécnicos Portugueses assinou com o
Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação
Profissional, Científica e Tecnológica, um protocolo que permitirá o
intercâmbio de 4,5 mil estudantes brasileiros nos próximos três anos.
Além
disso, Brasil e Portugal assinaram um memorando de entendimento para
que o reconhecimento de graus ou atribuição de equivalências de formação
em cursos superiores (como engenharia e arquitetura) se baseie em
mecanismos de avaliação e validação existentes nos dois países. Segundo
Crato, "as universidades portuguesas têm feito um esforço contínuo no
sentido de estreitar o diálogo com as congêneres brasileiras para
aperfeiçoar o sistema de reconhecimento de graus".
Universidade
de Coimbra - A Universidade de Coimbra é o principal destino dos
estudantes do Programa Ciência sem Fronteiras em Portugal. Segundo dados
da Capes, dos 783 estudantes de graduação enviados a Portugal pela
agência, 361 foram alocados na Universidade de Coimbra.
A
estimativa da Associação de Pesquisadores e Estudantes Brasileiros em
Coimbra (Apeb-Coimbra) é que cerca de 2,5 mil estudantes brasileiros
frequentem as aulas de diversos cursos (exatas, biomédicas e humanas) e
em diferentes níveis (da graduação ao pós-doutorado). Além de receber o
maior número de estudantes brasileiros do programa, cabe à Universidade
de Coimbra secretariar a recepção dos alunos e distribuir os bolsistas
por todas as universidades e instituições em Portugal.
A
Universidade de Coimbra é uma referência histórica para o Brasil desde a
época colonial. A instituição, uma das mais antigas da Europa (século
13), acolhe brasileiros desde o século 16. Segundo o vice-reitor,
Joaquim Ramos de Carvalho, 78% dos ministros brasileiros, entre 1822 e
1940, foram estudantes em Coimbra.
Carvalho
acredita que o acesso da elite brasileira aos estudos em Coimbra
contribuiu para a formação do Brasil como nação, inclusive para a
manutenção da extensão do território. "Se houvesse seis universidades no
Brasil, muitas pessoas da elite provavelmente não teriam se conhecido",
especula sobre a "capacidade de Coimbra de unir pontes do Brasil que,
de outra maneira, nunca se encontrariam".
"Cada
universidade faz uma elite, cada elite faz um país. No caso do Brasil,
não. As razões não foram as melhores, mas os portugueses nunca deixaram
perder o controle sobre a educação superior na então colônia, de modo
que chegamos ao século 19 a um conjunto relevante de pessoas que se
conheciam", explica o vice-reitor.
Segundo
ele, essa é uma das razões para a existência de um país de língua
portuguesa e de vários países de língua espanhola na América Latina. "Os
espanhóis foram criando universidades à medida que foram colonizando as
regiões, desde o século 17. Há uma correspondência de quase um para um
das universidades criadas e dos países que hoje existem", pondera
Joaquim Ramos Carvalho.
Atualmente,
a Universidade de Coimbra reúne estudantes de 82 nacionalidades. A
comunidade universitária equivale a um quarto da população da cidade de
Coimbra (cerca de 23 mil pessoas em um total de 100 mil habitantes). Com
tal proporção, muito do que ocorre na cidade gira em torno dos alunos
da universidade. "É uma cidade dos estudantes", comenta Viviane Carrico,
presidenta da Associação de Pesquisadores e Estudantes Brasileiros em
Coimbra (Apeb-Coimbra), destacando que as opções, tanto culturais quanto
de lazer, são inúmeras.
(Agência Brasil)
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