Anita Leocádia Prestes rejeitou convite para participar de sessão especial do Senado que devolve simbolicamente o mandato do líder comunista
Anita Leocádia Prestes, filha do principal líder
comunista brasileiro Luiz Carlos Prestes, não foi à
cerimônia realizada em sessão especial no Senado no dia 16 de maio de 2013, que
restituiu simbolicamente o mandato do político na Casa. “Para mim isso
é demagogia”, afirmou Anita, que é professora do Programa de
Pós-Graduação em História Comparada da Universidade Federal do Rio de
Janeiro (UFRJ) e presidente do Instituto Luiz Carlos Prestes.
“São 65 anos desde a cassação do PCB (Partido Comunista
do Brasil) - o PCB mudou de nome em setembro de 1960, quando passou a se
chamar Partido Comunista Brasileiro, alcunha que mantém até hoje. Em
1962, uma dissidência da legenda criou o PCdoB (Partido Comunista do
Brasil), que mantém o mesmo nome até os dias atuais - , quase 30 anos
desde que o País saiu do regime militar e vive em uma democracia. Por
que tanto tempo? Por que só agora?”, questiona Anita.
A professora afirma que o projeto, de autoria do senador
Inácio Arruda (PCdoB-CE), é uma tentativa da classe política “com a
imagem suja” de usar o nome do comunista para tentar “limpá-la”. “Estão
tão desmoralizados que resolveram apelar para a imagem do Cavaleiro da
Esperança (como Prestes passou a ser chamado depois das ações com a
Coluna Prestes) para limpá-la. É um ato demagogo”, ataca. “Recusei o
convite (para participar da sessão) por protesto e denúncia contra essa
demagogia.”
Historiadora com diversos artigos publicados sobre o
papel do PCB, de Prestes e dos demais parlamentares comunistas cassados
junto de seu pai, Anita é filha do político gaúcho com a alemã Olga
Benário, que conheceu na então União Soviética. Após um fracassado
levante em 1936 contra o governo Getúlio Vargas, no que ficou conhecido
como a Intentona Comunista, Prestes e a mulher foram presos.
De origem judaica, Olga, grávida de Anita, foi entregue
pelo governo ao regime nazista alemão. Lá, foi levada a um campo de
concentração, onde teve Anita e depois foi morta na câmara de gás. A
filha foi resgatada pela mãe de Prestes, Leocádia, que a trouxe de volta
para o Brasil.
Segundo a professora, seu pai não estaria de acordo com o
atual governo e os projetos aprovados pelos parlamentares, como o
Código Florestal. “Basta analisar a trajetória dele para saber que ele
não concordaria com a ausência de políticas favoráveis à reforma
agrária, com esse Código Florestal danoso, a flexibilização das leis
trabalhistas”, disse.
Cassação do PCB reflete medo de comunistas
De acordo com a historiadora, a cassação do registro do PCB, que culminou na perda do mandato dos parlamentares eleitos na eleição de 1945 pela sigla, em 1948, é um reflexo do temor vigente na época, gerado pela Guerra Fria – que polarizou a política da União Soviética e Estados Unidos. “Era uma época de extremo anticomunismo no Brasil”, diz Anita.
De acordo com a historiadora, a cassação do registro do PCB, que culminou na perda do mandato dos parlamentares eleitos na eleição de 1945 pela sigla, em 1948, é um reflexo do temor vigente na época, gerado pela Guerra Fria – que polarizou a política da União Soviética e Estados Unidos. “Era uma época de extremo anticomunismo no Brasil”, diz Anita.
Em 7 de maio de 1947, em meio ao governo Eurico Gaspar
Dutra, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), por três votos a dois,
cancelou o registro do Partido Comunista Brasileiro, depois que o
partido foi alvo de duas denúncias. Uma
delas afirmava que o PCB era uma organização orientada pelo comunismo
marxista-leninista da extinta União das Repúblicas Socialistas
Soviéticas (URSS); que, em caso de guerra com a Rússia, os comunistas
brasileiros ficariam contra o Brasil, e que o partido estaria a serviço
do governo soviético. A outra afirmava que, logo após seu registro, o
partido passou a exercer ações “nefastas”, insuflando a luta de classes,
fomentando greves e procurando criar desordem.
Além disso, a denúncia afirmava que o resultado das
eleições de 1945 – em que Prestes foi eleito senador e 14 nomes da sigla
foram eleitos para a Câmara dos Deputados – demonstrava que o PCB não
era brasileiro, "mas dependente do comunismo russo, diante da afirmação
do seu chefe de que combateria o governo que fizesse guerra a URSS para
reimplantar o fascismo", e que dependia do comunismo russo, o que seria
suficiente para provar “a colisão do partido com os princípios
democráticos e os direitos fundamentais do homem”, segundo o processo que oficializou a cassação do registro do partido.
“Esse processo foi vergonhoso e demonstrou que o TSE,
assim como o governo brasileiro, estava alinhado à política do governo
dos Estados Unidos”, afirmou Anita. "O medo do comunismo era muito
grande."
Estão tão desmoralizados que resolveram apelar para a imagem do Cavaleiro da Esperança para limpá-la. É um ato demagogo
Anita Leocádia Prestes
Professora da UFRJ e filha de Luiz Carlos Prestes
Com os votos favoráveis às denúncias, o PCB deixou de
ser considerado um partido legalmente, e, com a Lei nº 211, de 7 de
janeiro de 1948 - que extinguia o mandato dos parlamentares eleitos por
partidos que tiveram o registro cassado - Prestes e os 14 deputados
federais comunistas perderam seus postos.
Entre os parlamentares cassados havia nomes como o do
escritor Jorge Amado e líderes políticos como Carlos Marighela, Maurício
Grabóis e João Amazonas.
Os outros deputados cassados foram: Francisco Gomes,
Agostinho Dias de Oliveira, Alcêdo de Moraes Coutinho, Gregório Lourenço
Bezerra, Abílio Fernandes, Claudino José da Silva, Henrique Cordeiro
Oest, Gervásio Gomes de Azevedo, José Maria Crispim e Oswaldo Pacheco da
Silva.
Para Anita, restituições simbólicas não corrigem erro
Antes mesmo de o Senado restituir simbolicamente o mandato de Prestes, a Câmara já havia anulado a extinção do mandato dos deputados comunistas, no dia 20 de março deste ano.
Antes mesmo de o Senado restituir simbolicamente o mandato de Prestes, a Câmara já havia anulado a extinção do mandato dos deputados comunistas, no dia 20 de março deste ano.
Em 18 de abril, em ato semelhante, a Câmara de
Vereadores de São Paulo também reconheceu o mandato de membros eleitos
para o legislativo municipal que foram alvo da mesma resolução que
cassou Prestes e os deputados comunistas.
A medida reconheceu o mandato, entre outros, de Elisa
Kauffman Abramovich, tida como a primeira mulher eleita para o
legislativo paulistano.
Além dela, também tiveram seus mandatos reconhecidos
simbolicamente os vereadores comunistas Mário de Souza Sanches, Orlando
Luís Pioto, Adroaldo Barbosa Lima, Antonio Donoso Vidal, Armando
Pastrelli, Calil Chade, Itubirdes Bolivar de Almeida Serra, Benedicto
Jofre de Oliveira, Benone Simões, Raimundo Diamantino de Souza, Meir
Bernaim, Mauro Gattai, Luiz João e Carlos Niebel.
Para Anita, porém, os atos simbólicos não servem como
uma correção do passado. “Não corrige nenhum erro. É tarde demais. Não é
hora de se fazer isso”, afirmou.
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