Fonte: UOL Educação
Começo
minha coluna no UOL na ocasião do Dia do Professor, 15 de outubro. Não
há dúvida de que é o momento mais oportuno para iniciar qualquer
trabalho na área de educação. As pesquisas nacionais e internacionais e
as experiências bem-sucedidas de sistemas educacionais ao redor do mundo
e no Brasil mostram que a qualidade da educação é, em grande medida,
resultado da valorização social do professor. E no caso brasileiro é
ocioso dizer que vamos mal.
Embora as
diversas iniciativas e o consenso sobre sua centralidade, o que impede a
valorização docente? Em grande medida, o entrave é orçamentário. O
Brasil conta com mais de 2 milhões de educadores sub-remunerados atuando
na educação básica.
Recentemente,
os 27 governadores entregaram ao Governo Federal uma nova fórmula de
cálculo para reajuste do piso salarial nacional do magistério, que
atualmente é de R$ 1.567. Segundo a proposta dos governantes estaduais, o
piso passaria a ter valorização real, acima da inflação, na ordem de
0,5% a 2%. Já proposta elaborada pela Campanha Nacional pelo Direito à
Educação, pela CNTE e pela Undime (União Nacional dos Dirigentes
Municipais da Educação) geraria uma valorização real de 2,5% a 4%.
A questão é
mais complexa do que parece. Em lugar dos governadores se submeterem ao
Palácio do Planalto, pedindo apoio à sua proposta, deveriam exigir que o
Governo Federal cumprisse com o disposto no primeiro parágrafo do
artigo 211 da Constituição Federal: cabe a União colaborar técnica e
financeiramente com Estados, Distrito Federal e municípios para o
alcance de um padrão mínimo de qualidade. Não há dúvida de que o piso do
magistério compõe esse mínimo denominador comum, a qual nenhum educador
deve receber menos.
Colaborei
com nota técnica recente elaborada pela Fineduca (Associação Nacional de
Pesquisa em Financiamento da Educação). Nela, o professor José
Marcelino de Rezende Pinto (USP/Ribeirão Preto), a partir do estudo do
CAQi (Custo Aluno-Qualidade Inicial), mostra que faltam R$ 46,410
bilhões para a universalização plena do piso do magistério e a
consagração de uma política de carreira em todo o país, além de um
padrão mínimo de qualidade a partir de insumos. Contudo, esse é o
cálculo para as matrículas atuais. Ainda temos mais de 3,7 milhões de
crianças e adolescentes fora da escola, quase 14 milhões de analfabetos e
precisamos de mais 3,4 milhões de vagas em creches para matricular
apenas metade das crianças de 0 a 3 anos.
Claro que
governadores e prefeitos precisam fazer sua parte e não devem se eximir
de suas responsabilidades, esperando que o Palácio do Planalto cumpra
com sua obrigação constitucional. Mas é fato que a federação brasileira é
injusta e desigual. Segundo dados de 2010 do Conselho de
Desenvolvimento Econômico e Social da Presidência da República, a União
retém 57,1% dos recursos disponíveis arrecadados, sobrando 24,6% para os
26 Estados e para o Distrito Federal e apenas 18,3% para os mais de
5.565 municípios. No entanto, conforme informações de 2009 do Inep
(Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio
Teixeira), último ano em que foi feita essa comparação, a cada R$ 1
público investido em educação, Estados e o Distrito Federal despenderam
R$ 0,41, os municípios investiram R$ 0,39 e a União colaborou com só R$
0,20. Portanto, o Governo Federal arrecada bastante, mas contribui muito
pouco com a educação, especialmente com a educação básica - e o mesmo
ocorre com a política de saúde!
O salário e
a carreira são pressupostos para uma efetiva valorização da questão
docente, mas não encerram a questão. A professora Magda Soares (UFMG),
no encontro do Grupo de Trabalho de Alfabetização da Anped (Associação
Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação), defendeu que não
basta o Brasil pensar políticas de formação continuada. É preferível
trabalhar com a perspectiva de desenvolvimento profissional.
Hoje muitas
políticas de formação continuada, ao não dialogarem com a realidade das
escolas, com a categoria e com os pesquisadores da área, têm partido do
pressuposto de que o professor não sabe. Ele teve uma formação inicial
frágil, inadequada, pouco orientada aos desafios de sala de aula. E isso
precisa ser corrigido. Nesse contexto, as políticas de formação
continuada também não funcionam, pois têm sido implementadas como
formação "descontinuada", ou seja, por meio de ações dispersas, às vezes
repetitivas. Tratar o professor como um profissional desprovido de
conhecimento não colabora para seu aperfeiçoamento. Ou seja, é preciso
compreendê-lo como um profissional, que deve construir uma trajetória
crescente de desenvolvimento de sua profissão, aproveitando seus saberes
e estimulando-o a adquirir outros, por meio da reflexão sobre sua
prática.
Enfim, para
universalizar o direito à educação pública de qualidade, o Brasil
precisa fazer o básico: tratar o professor como um profissional,
respeitando-o como um profissional e, a partir daí, exigindo dele o que
se exige de um profissional. Soluções baseadas na descoberta de
variáveis mágicas, falsamente determinantes para a qualidade da
educação, continuarão a afastar o Brasil do caminho racional e concreto:
é preciso com seriedade e honestidade a valorização dos profissionais
da educação.
Blog rafaelrag com o professor Damásio
Nenhum comentário:
Postar um comentário