No sábado, 16 de setembro, é dia de segunda fase da olimpíada brasileira de matemática para escolas públicas.
O alagoano Krerley de Oliveira, 37, é professor universitário e ensina matemática a jovens da periferia de Maceió. Já o mineiro João César Campos Vargas, 19, é estudante e vai em breve estudar na Universidade de Princeton, nos Estados Unidos.
Eles representam duas gerações de matemáticos brasileiros que se encontraram pela primeira vez em junho deste ano, durante a Olimpíada Internacional de Matemática, realizada no Rio.
Krerley foi o líder da equipe nacional –professor responsável por comandar os alunos, enquanto João teve o melhor desempenho entre os brasileiros, terminando na 82ª posição entre 623 competidores de 112 países.
A trajetória dos dois mostra as mudanças na formação de matemáticos no país nas últimas décadas.
O alagoano só descobriu no ensino médio a habilidade para lidar com números, variáveis e formas abstratas.
Ele estudava em uma escola técnica federal em Maceió quando, aos 16 anos, foi descoberto por Elon Lages Lima, ex-diretor do Impa (Instituto de Matemática Pura e Aplicada), que estava na escola para dar um curso.
A convite de Lima, Krerley passou no exame do Impa e aos 17 já estava matriculado no mestrado da instituição, ao mesmo tempo em que cursava graduação em matemática na UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) –na verdade, só ia fazer as provas.
Apesar do talento, disputou apenas duas olimpíadas, uma brasileira e duas iberoamericanas, ambas quando já estava no Impa. `Em Maceió, as coisas chegavam mais devagar`, diz ele.
Em 2003, voltou à cidade como professor da Ufal (Universidade Federal de Alagoas) e logo criou a olimpíada estadual de matemática. Com um grupo de professores voluntários, Krerley hoje treina alunos de escolas de Maceió para competições olímpicas.
`Na verdade, muitos alunos gostam de matemática, mas às vezes não têm oportunidade de ter contato com uma matemática interessante`, diz ele. `Não existe a cultura de apreciar a sua beleza tanto quanto ela merece ser apreciada`, afirma.
São cerca de 30 escolas que selecionam alunos para, gratuitamente, assistirem a lições de matemática avançada. As aulas acontecem no centro de Maceió e no bairro de Benedito Bentes, onde Krerley passou a infância e a adolescência, na periferia da capital.
No Rio, durante olimpíada internacional, ele foi um dos responsáveis por selecionar as questões da prova –seis problemas para serem resolvidos em quatro horas e meia. Ele reviu velhos colegas do Impa e conheceu os novos talentos que mantêm o Brasil, segundo ele, como um `celeiro de matemáticos`.
O encontro com os seis representantes da equipe brasileira foi rápido –por ter acesso às provas, ele não pôde ter contato com os alunos antes da competição.
Entre os novos talentos que o alagoano encontrou no Rio estava João César, que começou a estudar matemática ainda no terceiro ano do ensino fundamental.
Na ocasião, ele frequentava uma escola estadual em Passa Tempo (MG) quando sua mãe, professora de história, levou para casa uma prova da Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas. `Era diferente da matemática da escola. Foi o espírito de desafio que me atraiu`, afirma ele.
A partir daí, sua atuação na matemática deslanchou. O primeiro ouro veio no sexto ano. Atualmente já são mais de 20 medalhas olímpicas, três delas na olimpíada internacional, a principal competição mundial. Em 2017, a 82ª colocação lhe valeu uma prata.
`As olimpíadas mostram aos alunos que a matemática é bem mais do que aquilo que veem na escola, aquela coisa maçante`, diz João.
`Muitas vezes, a matemática de escola estimula os alunos a aplicarem fórmulas repetidamente`, afirma. `Eles acabam não tendo a oportunidade de criar as coisas por eles mesmos. Isso não estimula a criatividade de ninguém. Você transforma a pessoa em uma máquina.`
O bom desempenho fez João ganhar uma bolsa de estudos em Princeton, para onde embarca no fim do mês.
Blog rafaelrag com Luis Costa, UOL Educação, 29/08/2017
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