Geneide Azevedo estimula o pai a fazer atividades básicas do dia a dia para atenuar os efeitos da doença
Identificada pela primeira vez em 1906, pelo médico alemão Alois Alzheimer, a doença de Alzheimer atinge hoje, de acordo com a Associação Brasileira de Alzheimer (ABRAz), cerca de 1.2 milhão de brasileiros. No mundo, os números alcançam a média de 35.6 milhões de pessoas e, a cada ano, surgem pelo menos 100 mil novos casos de pessoas diagnosticadas, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. E não para por aí: as previsões da Organização Mundial de Saúde indicam que, até 2050, é possível que o número de casos cresça em 500% em toda a América Latina.
De acordo com a neurologista Isabella Mota, o Alzheimer é uma doença degenerativa e de curso progressivo, que acomete, preferencialmente, pessoas acima de 60 anos – 6% das pessoas com mais de 70 anos têm a doença de Alzheimer. “O Alzheimer gera o comprometimento da cognição e afeta isso: memória, atenção, orientação de tempo e espaço, disfunção executiva. E, em geral, mais de um comprometimento cognitivo está relacionado à doença”, explica. Ela ainda acrescenta que o primeiro sintoma pode ser a perda de memória, mas que outros podem se manifestar antes, como as mudanças comportamentais.
Com o desenvolvimento da doença, o indivíduo torna-se cada vez mais dependente da ajuda do seu cuidador para realizar atividades básicas do dia a dia. Na fase final, ele perde controle da capacidade de se alimentar, do controle esfincteriano – capacidade para os processos de excreção – e de andar. Isabella pontua que o diagnóstico é eminentemente clínico, ou seja, é preciso avaliar todo o histórico do paciente, realizam-se testes neuropsicológicos e outros exames são feitos para descartar outras doenças. Assim, ressonância magnética, tomografia e exames de sangue são feitos apenas para excluir causas potencialmente tratáveis de distúrbios cognitivos.
As causas da doença ainda não são conhecidas, mas Isabella pontua que aqueles que a desenvolvem é porque dispõem de uma predisposição genética ao quadro degenerativo. Além disso, mesmo após anos, uma cura também não foi encontrada, entretanto existem tratamentos que podem retardar a progressão da doença. Alguns medicamentos como a rivastigmina, a donepezila, a galantamina são muito usados nas fases iniciais, podendo ser utilizados em associação à memantina nas fases moderada e severa.
“Outros fatores podem ser tratados também, como os distúrbios do sono e do humor – como depressão e ansiedade”, explica Isabella. Ela acrescenta também que é daí que surge a necessidade de uma avaliação bastante pontual para ver se os pacientes possuem queixas que possam ser tratadas com algum outro de tipo de medicação.
Cuidados da filha
Quando alguém chega a este mundo, são os pais os responsáveis por cuidar e ensinar o mais básico. Mas e quando a situação se inverte? Conforme o Alzheimer progrediu, a memória de seu Genaldo dos Santos se esvaiu, mas sua filha, Geneide Azevedo, assumiu a responsabilidade de cuidar e, diariamente, tentar estimulá-lo para que consiga fazer atividades básicas do dia a dia.
Ao ser questionada sobre o passado, a aposentada conta que nunca suspeitou que o pai pudesse ter a doença de Alzheimer, apenas achou que ele fosse um pouco esquecido. Contudo, foi quando uma amiga de Geneide, que já havia tido um contato anterior com pessoas que tinham Alzheimer, passou a observar certos comportamentos em Genaldo e sugeriu que a família procurasse um neurologista. Foi então que, aos 77 anos, o médico confirmou a suspeita, diagnosticando-o.
“O médico não falou muito e a gente também não entendia muito sobre a doença, então a gente teve que ir estudando”, conta Geneide. Ela explica que tudo mudou depois do diagnóstico. O começo foi muito complicado porque, ao iniciar o tratamento com as medicações, Genaldo teve reações muito fortes, sentindo dores no estômago e vômito. Posteriormente, a medicação foi trocada e houve uma maior tranquilidade.
Geneide conta que o impacto é gradual, tanto na vida de Genaldo, como na daqueles que estão ao redor, uma vez que a doença é lenta e gradativa. “Eu lembro de uma frase muito triste que a médica me disse: a doença ia a 100 por hora e, com o medicamento, ela iria a 80”, lamenta a filha. Entretanto, Geneide afirma que resta apenas continuar enfrentando esse sutil inimigo.
Como alternativas, ela costuma levar seu Genaldo para passeios. “Ele fez 80 anos e não quis festa, queria uma viagem. Ele pediu para ir à cidade dele, então nós o levamos. Ele pede muito por isso. Ele lembrou quando chegou lá, mas depois, para ele, ele não foi, porque ele esperava ver como era na época dele, de quando ele era menino”, relata. A aposentada também gosta muito de levá-lo até a casa dos amigos, onde passa momentos alegres.
Hoje, seu Genaldo já está próximo de fazer 88 anos e a doença, irrefreável, lhe faz companhia. A filha conta que ele ainda consegue andar, mesmo que com dificuldade, porém ele já não consegue lembrar de quando toma banho ou mesmo do que comeu. “Já mudou muito de quando começou. Ele já se perde: não sabe que dia é, que horas são, vai para a casa de alguém e não se lembra, apenas das pessoas do passado. Ele nem lembra que os pais morreram”, explica.
Além dela, seu Genaldo tem a esposa, genro e netos para cuidar dele. A filha conclui dizendo que a única opção é continuar lutando e que a família tenta sempre cercar Genaldo com bom humor, mas que é difícil enxergar que, a cada dia, ele tem perdido certas capacidades. Entretanto, é no amor que encontram a força para persistir zelando por ele.
Trabalho de cuidadores exige dedicação, carinho e amor
Do desejo de atender a uma população que está em constante crescimento, foi em novembro de 2012 que Maria das Graças Aguiar abriu uma empresa de cuidadores direcionada principalmente aos idosos. De acordo com a profissional, o cuidado tem que ser visto de uma perspectiva mais ampla e deve ultrapassar o simples acompanhamento das atividades diárias do indivíduo.
“Nosso foco é prestar assistência emocional e física para que nossos clientes mantenham uma vida completa e digna e assim possam continuar usufruindo, com seus familiares, dos bons momentos da vida”, esclarece Maria. Ela acrescenta ainda que, ao trabalhar com idosos, é preciso haver preparação e realizar trabalhos de prevenção, mantendo elevados níveis de alerta, mas também paciência e carinho.
Contudo, ela acrescenta que, ao trabalhar com um idoso que tem Alzheimer exige muito mais, principalmente daquilo no que tange o autoconhecimento do cuidador. “Um bom cuidador tem que se conhecer o suficiente para saber se conseguirá conviver com a dor, com o sofrimento dos pacientes de Alzheimer e demência. Saber se vai se adaptar, se terá paciência. As características são mais de personalidade do que de ferramentas”, explica.
Maria pontua que trabalhar com idosos, ainda mais em uma situação degenerativa, não é sobre ganhar dinheiro, mas sim sobre gostar de atender a essas pessoas e de garantir o seu bem-estar. É uma questão de vocação, especialmente porque se exige muito de um cuidador no que tange ao próprio controle emocional, já que não é fácil observar, nos pacientes, atitudes fora dos padrões habituais, porque ele apaga trechos do texto de sua vida.
Da experiência com esse perfil de paciente, Maria conta que outra característica comum é a perda das capacidades cognitivas. Ela explica que, em um dado momento, a pessoa não consegue aprender mais nada. “Lê um texto e não consegue memorizar. Busca uma palavra e não consegue lembrar. As lembranças começam a 'falhar', até o ponto em que a pessoa não consegue mais se comunicar consigo e com os outros”, lamenta.
A profissional conclui que, ao entrar neste ramo, fez uma descoberta: “É um trabalho integral, de dedicação total, de corpo e mente. E por isso deve ser feito com muito amor e carinho”.
Ambulatório da Memória atende pacientes com Alzheimer
Desenvolvido por uma equipe composta de neurologista, geriatras, psiquiatras e neuropsicológo, o Ambulatório da Memória tem prestado atendimento especializado a pacientes com mal de Alzheimer no Hospital Universitário Lauro Wanderley (HU). Isabella Mota integra esta equipe e afirma que o principal objetivo do grupo é oferecer uma avaliação de vários profissionais para o mesmo paciente, uma vez que se conhece a dificuldade de levar uma pessoa, cuja cognição está comprometida, a vários médicos.
Aberto há cerca de um ano e meio, o ambulatório possui uma parceria com o ambiente acadêmico. “Algumas avaliações neuropsicológicas nós mandamos para a Pós-graduação de Neuropsicologia da UFPB, que dá esse suporte para a gente do ponto de vista neuropsicológico”, afirma Isabella. Ela acrescenta que essa associação é fundamental para conquistar avanços no tratamento do Alzheimer, porque novos estudos e pesquisas estão sempre surgindo. Dessa forma, é possível aplicar aquilo que é estudado em mestrados e doutorados nos pacientes que recorrem ao ambulatório.
A neuropsicóloga afirma que pacientes com quadros demenciais são muito complexos e esse ‘mix’ de percepções garante a sustentação da qualidade de vida, tanto do paciente, como de seu cuidador. “Nós dizemos que a doença é a mesma, mas que a visão de cada especialista é diferente”, relata. Ela acredita que esse é um serviço muito positivo, porque o atendimento ao paciente é direcionado e muito mais completo.
O ambulatório também oferece outro serviços: cursos para cuidadores, que estão sempre sendo divulgados nas instalações do HU. Nele, as pessoas podem aprender um pouco melhor sobre a doença, como ela evolui, as medicações que devem ser usadas e novas perspectivas de tratamento. “Porque realmente é o cuidador que está no dia a dia com o paciente, os médicos são muito mais orientadores, então o cuidador também faz parte do tratamento da doença”, esclarece. De acordo com Isabella, pacientes com quadros demenciais, especialmente o Alzheimer, tendem a se sentir tristes ou mesmo inseguros. Assim, a posição do cuidador mediante as dificuldades apresentadas faz uma diferença muito grande no paciente, de forma que é possível melhorar as capacidades e comportamentos da pessoa adoentada.
Onde buscar atendimento gratuito para a doença?
• Hospital Universitário Lauro Wanderley. Atendimento 24h, de segunda a domingo, mas as consultas são realizadas durante os períodos matutino e vespertino de segunda à sexta-feira. Antes de visitar o HU em busca de atendimento com o neurologista, é preciso ir até um Posto de Saúde da Família (PSF) para receber um encaminhamento.
- Endereço: UFPB Campus I, Avenida Contorno das Cidades. Bairro Cidade Universitária.
- Telefone: (83) 3216-7042
• Clínica Escola de Psicologia Unipê. Atendimento de segunda à sexta, das 9h às 21h.
- Endereço: Bloco F do Unipê, BR-230 - Km 22. Bairro de Água Fria.
- Telefone:(83) 2106 9218
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