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quinta-feira, 23 de maio de 2013

Luiz Gonzaga, o rei do Baião

De uma geografia a outra do Brasil, ouviu-se o mesmo bordão: se vivo estivesse, Luiz Gonzaga estaria completando cem anos de existência; o Velho Lua, referência insubstituível e inafastável da cultura musical brasileira, da qual foi e é ícone superlativo. Se “esquecer é uma necessidade”, como afirma o filosófico e sentencioso narrador machadiano, lembrar é compromisso intransferível do afeto e imperativo categórico de justiça e de reconhecimento público. Um antídoto seguro contra o que não pode jazer nas frias lajes da deslembrança injusta e radical. E o continental país chamado Brasil não tem cessado de recordar da gigantesca obra construída pelo ilustre filho da cidade pernambucana de Exu, Luiz Gonzaga.
A despeito de ter sido alvo de inúmeras apreciações críticas, mais de quarenta livros já foram publicados a seu respeito, inclusive abordagens acadêmicas em nível de mestrado e doutorado, o espólio estético-sociológico-musical de Luiz Gonzaga ainda pontifica como um desafiador convite para tantos quantos intentarem se debruçar sobre a multiplicidade temática por ele potencializada.
Poeta do sertão em suas vertentes lírica, épica e dramática, Gonzagão foi o Fidelíssimo intérprete da sofrida e esperançosa alma do homem nordestino, notadamente o habitante da espacialidade campesina, frequentemente confundido com uma espécie de ilha cercada de adversidades por todos os lados, com destaque para as que têm nas intempéries climáticas, acumpliciadas á falta de políticas estatais estruturantes para o semiárido, o seu indesviável ponto de confluência. Que o diga a inaceitável estagnação das obras de transposição do Rio São Francisco, por um lado, e a orgia financeira na construção de colossos esportivos para a realização da copa do mundo, por outro.
Contudo, a poética de Luiz Gonzaga não se constitui apenas num baião de uma nota só. Se foi testemunha solidária da Triste Partida dos seus patrícios em busca de uma Pasárgada sempre distante e, invariavelmente, inalcançável, foi também a cantora perfeita de uma natureza, ora exuberante, com suas luzes, cores e trinados, ora áspera, com a sua paisagem crestada pelo calcinante e esterilzador sol das impiedosas secas. Foi a tradutora comovida de um telurismo acendrado e assumido. Foi a confissão de um peregrino, cuja odisseia privilegiada era “andar por este país, pra ver se um dia descanso feliz”.
Seu Lua foi, de igual modo, o esteta do humor; o trovador das mulheres, do amor; o contista da malandragem dos heróis e anti-heróis que povoam a cidade e o campo da desbordante paisagem humana nacional. Foi o admirável contador de estórias; o romancista, ingênuo e lúdico, da “vida como ela é”; e, como somente ele soube transfigurar, na Asa Branca da sua terna e eterna arte musical.

Fonte JOSÉ MÁRIO DA SILVA (*)
Docente da UFCG / Ensaísta
 
Blog rafaelrag com Tiago  do blog Alagoa Grande

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